No dia 29/01/2020, viajei de São Paulo para o Rio de Janeiro, num maravilhoso ônibus de turismo, com retorno para São Paulo no dia 04/02/2020, ou seja, descendo a Serra das Araras, no município de Piraí/RJ, no sentido SP/RJ e subindo no sentido RJ/SP. Pois bem, a viagem seguia rápida, confortável, segura, aí de repente um gigantesco congestionamento na descida da Serra das Araras. Esta Serra é de uma beleza natural de tirar o fôlego, apesar de perigosa.
O congestionamento foi causado por um caminhão tombado, felizmente sem vítimas, apenas danos materiais. Depois de passar este sinistro a viagem ocorreu rápida e tranquila, apesar das duas horas de atraso. Um atraso que não me aborreceu devido à beleza do lugar e o conforto do ônibus. O que eu não sabia, é que naquela Serra, em 1967, ocorreu o maior desastre natural da História do Brasil, e hoje quase ninguém sabe deste ocorrido, que devido às circunstâncias e dificuldades da época foi pouco divulgado e caiu no esquecimento.
Uma cruz de 10 metros na subida da Serra das Araras (Piraí-RJ), no local conhecido por Ponte Coberta, marca o início de um enorme cemitério construído pela natureza. Lá estão cerca de 1.400 mortos (fora os mais de 300 corpos resgatados) vítimas de soterramento pelo temporal que atingiu a serra em janeiro de 1967. Foi a maior tragédia da natural da história do país.
No episódio da Serra das Araras, suas encostas praticamente se dissolveram em um diâmetro de 30 quilômetros. Rios de lama desceram a serra levando abaixo ônibus, caminhões e carros. A maioria dos veículos jamais foi encontrada. Uma ponte foi carregada pela avalanche. A Via Dutra ficou interditada por mais de três meses, nos dois sentidos.
Para se ter uma idéia do que ocorreu na Serra das Araras basta comparar os índices pluviométricos. A tragédia de Teresópolis ocorreu após um volume de chuvas de 140mm em 24 horas. Na Serra das Araras, em 1967, o volume de chuvas chegou a 275 mm em apenas três horas. Quase o dobro de água em um oitavo do tempo.
Mas o episódio da Serra das Araras parece ter sido apagado da memória do país e, especialmente, da imprensa. O noticiário dos veículos de comunicação enfatiza que a tragédia da Região Serrana do Rio superou o desastre de Caraguatatuba em março de 1967. O caso da Serra das Araras, ocorrido em janeiro daquele mesmo ano, sequer é citado.
O resgate era das tarefas mais difíceis. Com uma corda amarrada a seus corpos, sete homens desciam por crateras cheias de cadáveres, pegavam corpo por corpo e eram puxados para cima. A missão foi dada pela polícia a um grupo de prisioneiros que estava na delegacia de Piraí. Pela ajuda na operação, o grupo ficou conhecido como “os sete homens bons”.
A enxurrada soterrou o ônibus da Viação Única, que precisou ser serrado ao meio para a retirada dos corpos.
Gilvan Rodrigues Leite (Gestor Público e Ambiental Aposentado).